DISTÂNCIA ENTRE NÓS
Há uma distância entre tu e eu
Que não se mede em quilômetros
Ou horas que o carro percorreu.
Tão pouco é medida em centímetros
Ou segundos que o atleta venceu.
Entre nós a distância é de valores
Limitada por barreiras invisíveis.
Tem diferentes formas de amores
Palavras há tempos inconcebíveis
Com sons ruidosos e novas cores.
Para ti distante é o tempo futuro.
Meu presente faz parte do passado.
Entre ambos ergueste um muro,
E segues apenas de um lado
Mais veloz, porém menos seguro.
Nos autosserviços vais com afã.
Queres bigs, fanta MAIS quarteirões.
Tua linguagem me parece anã,
Mas sigo à risca tuas orientações,
E da janela caem tortas de maçã.
Ainda com o carro em movimento
Desembrulhas tudo com facilidade.
Abocanhas pão sovado, regas condimento,
E enquanto percorremos a cidade,
Comes fritas e refri vais sorvendo.
Fascinada com tudo na verdade,
Percebo como é difícil alcançar-te,
Mas mantenho a pose típica da minha idade
E decido ainda aconselhar-te:
-Come devagar, para melhor digestibilidade.
ESPELHO, ESPELHO MEU!
Espelho, espelho meu!
Mostra-me a verdadeira face.
Desnuda-me de mim mesma.
De cara com minha cara
Sem disfarce, sem muralha,
Com dedo em riste, mudo
Grita de frente quem sou.
Em tua presença, sem escudo,
Vejo linhas irregulares
Do tempo que envelheceu
Em condições singulares.
Sinalizam minhas perdas
Em momentos e lugares.
Reflete a luz incandescente
Que do meu olhar se perdeu.
Aproxima minha mente
Da graça de um camafeu.
Energiza a pele encorpada
Que, sem visco, esmaeceu.
Não importa, espelho meu!
Se, em tua sentença atroz,
Calas meu canto desentoado,
Aprisionas minha voz.
Sigo a cantar mentalmente
A riqueza dos anos dourados
Que a vida me deu de presente.
COMICHÃO
Meu compromisso é com a rotina,
Minha sina é a tradicional sina.
De repente ( nem Freud explica)
Vem o danado do comichão. Coça!
Nos ouvidos... a muriçoca azucrina.
Quero manter-me na rotina,
Quero cumprir traçada sina.
Ah, que perturbação!
Que coceira! Coça...coça...
Muriçoca nos ouvidos
Zoa...Zoa...
Não presto atenção. Ou presto?
Que sono! Faz parte da rotina: dormir!
É a sina!
Oito horas? Pelo menos seis...
Bocejo. Espreguiço.
Continua o comichão,
Continua a muriçoca.
Não dá pra ignorar: Eles são os reis
Sento-me na frente do computador
E escrevo um poema
Outra vez...
fonte: http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/distrito_federal/sandra_fayad.html